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sexta-feira, 18 de outubro de 2024



Minha mãe numa locomotiva?

Era uma tarde típica das tardes de primavera, quando as temperaturas ficam amenas e a floração de diversas plantas começava a acontecer. No Brasil, a primavera é caracterizada como uma estação de transição entre inverno e verão. Na primavera, após o inverno, iniciam-se as chuvas que são mais frequentes com a chegada do verão.

O vento forte agitava as vegetações e ao mesmo tempo levantava os papéis que estavam na praça próxima a estação de trens, no município de Vargem Alta. A estação tinha um estilo antigo, construção feita com tijolinhos maciços que suportavam não somente as intempéries e os abalos causados pelas passagens dos vagões abarrotados de bolinhas de minérios.

A tarde já havia dado ar de sua graça e o impiedoso vento soprava com uma força descomunal e conversarmos animadamente numa padaria tomando um bom café até o momento que fomos convidados para ir à estação, pois o trem estava preste a chegar em pouco  mais de cinco vinte minutos uma vez que o sinal já havia sido dado pelo chefe da estação.

Caminhamos lentamente e a conversa era em torno do tempo que trazia saudades e lembranças de um passado bem distantes de histórias que eram contadas pela minha mãe, sobre a sua infância numa “parada” de Coronel Benjamim, nome que era dado aos locais por onde o trem passava e parada para que os passageiros daquele local pudessem descer ou subir.

Eram reminiscências de um tempo em que se levantava bem cedo para ascender o pegar a lenha que era armazenada num depósito sempre do lado de fora da casa. Fogo aceso, vasilha grande colocada na primeira trempe do fogão, banana da terra no segundo vasilhame, o bolo de fubá já estava pronto desde o dia anterior, era hora de acordar a meninada para tomar café e cada um cuidar da sua obrigação. Eram histórias singelas e tocantes.

Entre histórias e caminhada, finalmente chegamos no pequeno pátio da estação de trens. O povo se acotovelava. Alguns esperando o trem para viajar, outros esperando a chegada de parentes, vindo da capital, Vitória. Sempre era uma grande festa e muito sorrisos espalhados pelo ar e algumas lágrimas rolando nas faces daqueles que não queriam partir.

Para surpresa geral, os vagões de passageiros estavam quase todos lotados e não havia muito havia lugares disponíveis para que todos se acomodassem de maneira confortável. Então surgiu um grande problema: nem todos conseguiram prosseguir viagem. O que se poderia fazer?

Foi então que absurdamente meu pai, sugeriu que fossemos levados para o interior de uma locomotiva que rebocava os vagões e ali, estaríamos seguros para fazer a tão esperada viagem. Com a concordância do responsável pelo trem, subimos sem muitas dificuldades as escadas e adentramos o interior da máquina.

Os olhos dela ficaram fixado na quantidade de controles que os maquinistas utilizavam para fazer como um trem com diversos vagões de cargas e passageiros se locomovessem pelas estradas de ferro que ligavam Cachoeiro à Vitória.

Confesso que nunca se passara pela minha cabeça que minha mãe um dia entraria numa locomotiva, pois essa sempre fora o meu sonho, mas realizá-lo juntamente com ela e meu pai. Essa cena, nunca havia se passado nos meus melhores sonhos.

Na minha curiosidade de criança, fiquei encantado com tudo aquilo e minha primeira vontade era de mexer em todos os botões, ficar na janela, simulando que estava operando o trem, mas logo fui impedido pelo meu pai que deixou bem claro que meu desejo não seria possível.

Recoloquei-me no meu cantinho e fiquei meio triste com a observação de que não poderia ser o maquinista do dia daquela viagem, contentei-me em apenas curtir o momento viajando como um carona privilegiado.

Tudo pronto para viagem e quando o maquinista deu o apito tradicional para partida da estação de Vargem Alta, aconteceu algo incrível: acordei e descobri que era apenas um sonho. Foi um sonho bom que me levou a revisitar lugares e rever pessoas que se foram há tempos e no momento guardo boas lembranças no meu coração e nesse caso preciso citar o meu querido e saudoso pai.

Não acredito que um dia farei uma viagem na locomotiva com a minha mãe, mas tenho certeza de que ainda podemos viajar nas nossas lembranças, pensamentos e emoções junto aos nossos entes queridos que temos conosco todos os dias. Enquanto temos vida temos tempo, mas o tempo é inflexível e precisamos aproveitá-lo junto aos nossos entes queridos enquanto podemos dizer: eu te amo, você é importante, me perdoe e aceito o seu perdão, afinal necessitamos uns dos outros.

É isso por hoje... é vida que segue!!!

 


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