Era uma tarde típica das tardes de primavera,
quando as temperaturas ficam amenas e a floração de diversas plantas começava a
acontecer. No Brasil, a primavera é caracterizada como uma estação de transição
entre inverno e verão. Na primavera, após o inverno, iniciam-se as chuvas que
são mais frequentes com a chegada do verão.
O vento forte agitava as vegetações e ao mesmo
tempo levantava os papéis que estavam na praça próxima a estação de trens, no
município de Vargem Alta. A estação tinha um estilo antigo, construção feita
com tijolinhos maciços que suportavam não somente as intempéries e os abalos
causados pelas passagens dos vagões abarrotados de bolinhas de minérios.
A tarde já havia dado ar de sua graça e o
impiedoso vento soprava com uma força descomunal e conversarmos animadamente
numa padaria tomando um bom café até o momento que fomos convidados para ir à
estação, pois o trem estava preste a chegar em pouco mais de cinco vinte minutos uma vez que o
sinal já havia sido dado pelo chefe da estação.
Caminhamos lentamente e a conversa era em torno
do tempo que trazia saudades e lembranças de um passado bem distantes de
histórias que eram contadas pela minha mãe, sobre a sua infância numa “parada”
de Coronel Benjamim, nome que era dado aos locais por onde o trem passava e
parada para que os passageiros daquele local pudessem descer ou subir.
Eram reminiscências de um tempo em que se
levantava bem cedo para ascender o pegar a lenha que era armazenada num
depósito sempre do lado de fora da casa. Fogo aceso, vasilha grande colocada na
primeira trempe do fogão, banana da terra no segundo vasilhame, o bolo de fubá
já estava pronto desde o dia anterior, era hora de acordar a meninada para
tomar café e cada um cuidar da sua obrigação. Eram histórias singelas e
tocantes.
Entre histórias e caminhada, finalmente
chegamos no pequeno pátio da estação de trens. O povo se acotovelava. Alguns
esperando o trem para viajar, outros esperando a chegada de parentes, vindo da
capital, Vitória. Sempre era uma grande festa e muito sorrisos espalhados pelo
ar e algumas lágrimas rolando nas faces daqueles que não queriam partir.
Para surpresa geral, os vagões de passageiros
estavam quase todos lotados e não havia muito havia lugares disponíveis para
que todos se acomodassem de maneira confortável. Então surgiu um grande
problema: nem todos conseguiram prosseguir viagem. O que se poderia fazer?
Foi então que absurdamente meu pai, sugeriu que
fossemos levados para o interior de uma locomotiva que rebocava os vagões e
ali, estaríamos seguros para fazer a tão esperada viagem. Com a concordância do
responsável pelo trem, subimos sem muitas dificuldades as escadas e adentramos
o interior da máquina.
Os olhos dela ficaram fixado na quantidade de
controles que os maquinistas utilizavam para fazer como um trem com diversos
vagões de cargas e passageiros se locomovessem pelas estradas de ferro que
ligavam Cachoeiro à Vitória.
Confesso que nunca se passara pela minha cabeça
que minha mãe um dia entraria numa locomotiva, pois essa sempre fora o meu
sonho, mas realizá-lo juntamente com ela e meu pai. Essa cena, nunca havia se
passado nos meus melhores sonhos.
Na minha curiosidade de criança, fiquei
encantado com tudo aquilo e minha primeira vontade era de mexer em todos os
botões, ficar na janela, simulando que estava operando o trem, mas logo fui
impedido pelo meu pai que deixou bem claro que meu desejo não seria possível.
Recoloquei-me no meu cantinho e fiquei meio
triste com a observação de que não poderia ser o maquinista do dia daquela
viagem, contentei-me em apenas curtir o momento viajando como um carona
privilegiado.
Tudo pronto para viagem e quando o maquinista
deu o apito tradicional para partida da estação de Vargem Alta, aconteceu algo
incrível: acordei e descobri que era apenas um sonho. Foi um sonho bom que me
levou a revisitar lugares e rever pessoas que se foram há tempos e no momento
guardo boas lembranças no meu coração e nesse caso preciso citar o meu querido e saudoso
pai.
Não acredito que um dia farei uma viagem na
locomotiva com a minha mãe, mas tenho certeza de que ainda podemos viajar nas
nossas lembranças, pensamentos e emoções junto aos nossos entes queridos que
temos conosco todos os dias. Enquanto temos vida temos tempo, mas o tempo é
inflexível e precisamos aproveitá-lo junto aos nossos entes queridos enquanto
podemos dizer: eu te amo, você é importante, me perdoe e aceito o seu perdão,
afinal necessitamos uns dos outros.
É isso por hoje... é vida que segue!!!