Um olhar perdido...
Era um domingo de muito sol e
como de hábito, após o almoço fiquei sentadinho no meu cantinho lendo o meu
livro e vez por outra observando o movimento do ambiente.
Tenho predileção pelo
Restaurante Gussani, que fica próximo à Praça da Praia das Gaivotas em Vila
Velha e sempre que posso faço minhas refeições lá nos finais de semana. O local
é bucólico e rústico, porém o atendimento é ótimo e a refeição é caseira e combina
com o ambiente que é totalmente familiar. Costumo chegar bem cedo quando o
restaurante ainda não começou a funcionar e normalmente saio quando está
prestes a fechar.
Naquele domingo, cheguei um
pouco mais tarde e como de costume assim que terminei a minha refeição fiquei
sentadinho no meu cantinho atento na minha leitura e de vez quando fazendo
aquilo que amo fazer que é observar o ambiente e consequentemente o comportamento
das pessoas.
Como num típico dia de verão e
com um sol extremo muita gente naquele horário voltava da praia e várias
famílias adentravam o ambiente em busca de um bom almoço. Alguns comeram
apressadamente como se o mundo fosse acabar enquanto outros numa lentidão comparável
ao bicho preguiça.
No meio de todo esse
movimento, percebi a chegada de uma senhora com passos curtos e apresentava uma
certa dificuldade para caminhar. Após escolher uma mesa, depositou seus
pertences e foi pegar sua refeição. De volta ao local escolhido, começou a se
alimentar vagarosamente como se estivesse com dificuldades para fazer a
mastigação e além desse fato, observei que o olhar daquela senhora parecia vago
e perdido.
Terminada a refeição o garçom
recolheu copo, prato e talheres, mas ela permaneceu sentadinha e quase imóvel
naquela mesa no cantinho do restaurante. Foi uma cena que tocou o meu coração,
pois me trouxe à memória a figura de minha mãe, uma mulher de 88 anos de idade
que criou filhos e teve uma participação importante na criação dos netos.
Fiquei imaginando o que estava
passando pelo coração daquela senhora e quero te convidar a me acompanhar em
algumas possibilidades. Quem sabe que naquele momento ela se lembrasse do tempo
de convívio com o seu marido. Pode ser que a tempo em que viveram juntos tenham
realizados a maioria dos planos sonhados quando começaram a namorar. Aquela
senhora me parecia viúva por ter duas alianças na sua mão esquerda pois isso
sempre foi uma tradição dos antigos.
Seria um olhar perdido em meio
as saudades dos filhos que se casaram ou quem sabe vivem em outra parte do país
ou mesmo fora dele. Por outro lado, pode ser que “as crianças” para os pais os
filhos nunca crescem, tenham abandonado aquela mãe por ela ser uma pessoa idosa
e por isso ela gosta de ir aos lugares onde possa estar entre pessoas,
amenizando a sua solidão.
Aquele olhar perdido, poderia
ser de lembranças de um tempo bom de sua infância com suas amigas quem sabe
aprontando nas escolas ou nas brincadeiras de crianças tais como passar anel,
salada de frutas, jogar queimada, andar a cavalo, tomar banho no açude ou nos
namoros escondidos dos pais que não passavam de encontros fortuitos após ou
durante as e missas e quermesses nas Paróquias do interior do Brasil.
Mas aquele olhar perdido, me
fez pensar como deve ser difícil para os mais idosos quando os seus amigos
começam a partir e aquela estranha sensação de ser o próximo ou próxima da
lista, pois alguém já disse que pela ordem natural das coisas os mais velhos
morrem primeiro, mas na vida não existe ordem natural para morrer e
lamentavelmente, pois os nossos jovens morrendo.
Após mais de vinte minutos de
devaneios e olhares perdidos, aquela senhora levantou-se com a mesma
dificuldade que sentara, encaminhou-se até o caixa, pagou e saiu desaparecendo
da minha vista em busca do seu mundo. Fiquei envolto nos meus pensamentos: para
onde foi aquela senhora? Ao chegar em casa num domingo onde muitas famílias se
encontram mesmo que seja para brigar, haveria alguém esperando por ela? Como
seria o final de tarde daquela senhora? São perguntas que ficaram no meu
coração e não sei se algum dia terei respostas!
Aquele olhar perdido me deixou
algumas lições que compartilho finalizando essa crônica: preciso valorizar os
idosos de minha família ou mesmo fora dela; nossos idosos necessitam de tempo
de qualidade através de atenção exclusiva sem celulares e distrações que são
tão comuns em nossos dias e fundamental ouvir suas histórias pacientemente
mesmo que algumas sejam repetidas, mas são memórias de histórias que foram
importantes na vida deles que as novas gerações não gostam de ouvir.
Pensando naquele olhar
perdido, resolvi aproveitar a oportunidade de me retirar do recinto pois todos
os clientes já haviam deixado o local e a proprietária do estabelecimento por
educação me deixou escrever esse texto...
É isso por hoje... é vida que
segue!
Muito bom !!!!
ResponderExcluirPrimo, obrigado pela leitura. Pensei nos nossos velhos que vivem jogados a própria sorte.
ExcluirAbraços